segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Jornalismo - O mesmo cardápio, quarenta anos depois

Reproduzo alguns trechos do brilhante artigo do jornalista Washington Araújo (dono do blog Cidadão do Mundo) sobre o Jornal Nacional:

"O ditador da moda

Aos 40, o Jornal Nacional continua ditando a moda jornalística, sim, porque no Brasil há sempre um modismo evidente ou camuflado, mas moda sempre seguida. A começar pela bancada com traços abertamente futuristas, a verdade é que a do Jornal Nacional é obra de arte, é senso estético à flor dos olhos. Depois temos a indefectível vinheta em frenético movimento com a nervosa musiquinha que de tanto ser vista e ouvida passou a ser símbolo de telejornal da noite, de telejornal da Globo.

Não importa quanto tempo seja campeão de audiência, outra verdade é que o Jornal Nacional consolidou no Brasil – e é seu melhor representante – o jornalismo espetáculo, o jornalismo como show, o jornalismo com cabeça e olhos de cinema. Com apresentadores sempre impecavelmente bem trajados, maquiagem e cabelos à prova de qualquer tsunami e, principalmente, contando com gente talentosa, com dicção muito acima da média, não há como negar que é este o telejornal que melhor personifica o sempre comentado padrão Globo de qualidade televisiva.

O que incomoda é essa estranha capacidade que o JN tem de recriar todo santo dia esse clima de cumplicidade com o telespectador, um clima que favorece esquecer as agruras do dia e postar os olhos, qual hipnotizado, no que está sendo dito por William Bonner ou por Fátima Bernardes. E não importa se a notícia é sobre o recuo de Barack Obama em sua intenção de instalar sistema defensivo antimíssil no Leste Europeu (Polônia, República Checa ou Eslováquia). Convenhamos que não é assunto corriqueiro nessa paragens tropicais. Mesmo assim tudo é consumido de maneira natural e pouco importa se trocamos os mísseis pela cobertura do funeral-espetáculo do astro pop Michael Jackson ou do funeral-parada militar do longevo senador Ted Kennedy.

Em ritmo de videoclipe, a realidade perde seu eixo e já não se sabe o que é realidade filmada do que é realidade fabricada. O show em que o jornalismo se transmuta é tão bem feito, tão bem calculado em milésimos de segundos que após assistir a uma edição do JN pouco, bem pouco, fica retido em nossa memória, pois embarcamos do real para o ilusório em fração de segundos.

[...]

Semana retrasada, tentando salvar meu domingo diante de TV enquanto trocava os canais me deparei com o William Bonner – com sua mulher e filhos – tentando responder ao apresentador Fausto Silva, que o apresentara à amestrada claque, voltando a abusar de sua preferida ladainha louvaminheira – "ninguém é tão ético, é tão profissional, é tão bom caráter, é tão glorioso, é tão gente, é tão querido pelos colegas, é tão generoso na profissão, é tão hiperamigo" – sobre como o casal fazia o Jornal Nacional. A resposta do Bonner foi sintomática: "Primeiro temos que preparar o cardápio" (ou algo assim).

Logo me desliguei do assunto e pensei com meus botões que o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, até que não estava tão equivocado assim ao ter equiparado a profissão de jornalista com a de cozinheiro. É que o JN é feito sob medida, segue uma receita, tem um cardápio a oferecer. E neste cardápio nem sempre assoma o objetivo consciente do jornalista e da empresa de informar o espectador e demonstrar de forma inequívoca sua honestidade para com a veracidade jornalística.

Porque no jornalismo não existe meio termo – ou se conspira ou se denuncia a conspiração."

Para ler o artigo completo, clique aqui.

Bem.
Pegando um gancho no post da semana passada, critiquei o sistema de ensino do jornalismo no Brasil por se dar nos "8 ou 80": ou o estudante cria um ódio mortal pela profissão, passando a criticá-la veementemente, ou assume todas as vergonhas claras dela e assassina o padrão ético de excelência, aparentemente divergente do mercado editorial.

Washington Araújo, por sua vez, confirma essa tese, carregando-a para fora da discussão acadêmica. Bem, saindo do lado técnico...

A crítica do jornalista ao JN é simplesmente verdadeira. O jornalismo dado como show, e já analisado por muitos intelectuais da área, é a receita certa do telejornal brasileiro. O cardápio, já existe, há 40 anos ele foi descoberto e explorado por gente sem compromisso acadêmico ou social. E, como se vê diariamente, ele funciona até hoje.

Porém, está longe de ser perfeito. O padrão técnico é de primeiro nível. Entretanto, o padrão de conteúdo dia a dia se confunde com as 3 ou 4 novelas que o circundam. Contamina-se com a superficialidade da TV, a mercadologia da empresa de comunicação, a sede de ganhos do setor comercial.


No meio desse bolo, montado pelos cozinheiros de sempre, o jornalismo entra no segundo plano. Ele se transformou numa vinheta - aquela ouvida inconfundivelmente anos após anos - e numa logo. O jornalismo apenas cedeu a letra "J" para essa logo, mas logo foi esquecido, menosprezado. O que me resta, é perguntar a mim mesmo se um dia eu verei o jornalismo, nu, só. Espero que o leitor se faça a mesma pergunta de vez em quando.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Jornalismo - Diretrizes Curriculares (I)

Foi apresentada na última sexta feira (18/09) uma proposta de revisão das matrizes curriculares do curso superior de Jornalismo. Elaborada por uma comissão especializada, liderada por José Marques de Melo, a proposta prevê algumas mudanças fundamentais no curso: aumento da carga horária, instituição do estágio obrigatório e separação do Jornalismo da Comunicação Social.

José Marques de Melo, presidente da comissão de especialistas que elaborou a resolução.

Separarei essa questão em alguns posts, para versar sobre as questões que eu achei mais interessantes - e também complexas. A primeira, de hoje, diz respeito a esse parágrafo da resolução:

"[...] o conteúdo profissional do curso passou a ser caracterizado como "meramente técnico" e destituído do interesse teórico. Por outro lado, a teoria da comunicação evoluiu desvinculada do exercício da profissão, focada numa crítica geral da mídia, sem compromisso com o diálogo para uma intervenção prática na mesma. Em decorrência, os estudantes de Jornalismo desde então têm sido forçados a uma opção dramática e pouco razoável entre negar a sua profissão, em nome do "espírito crítico", ou desprezar a teoria estudada nos cursos para se voltarem à prática, reproduzida de maneira acrítica e envergonhada. A ênfase na análise crítica da mídia, quando feita sem compromisso com o aperfeiçoamento da prática profissional, abala a confiança dos estudantes em sua vocação, destrói seus ideais e os substitui pelo cinismo [COHEN, Jeremy et al. Symposium: Journalism and Mass Communication Education at the Crossroads. Journalism and Mass Communication Educator 56/3, Autumn 2001]".

Bem. Tratando da questão da separação do Jornalismo da Comunicação Social, a resolução discorre sobre o dilema do estudante de Jornalismo - a aceitação do espírito crítico e marxista, negando a profissão como ela é, ou se voltar completamente à prática (eliminando a praxiologia buscada) e ignorar a evolução dos estudos de Jornalismo, sua deontologia, ética, história, até mesmo a paixão que sempre envolveu a profissão.

Este blogueiro aceita esses argumentos como verdadeiros - a relação (quase) estritamente mercadológica das relações públicas e da publicidade se entrelaça com os valores peculiares e delicados da profissão jornalística, e isso é extremamente prejudicial. Claro que esse desprendimento do mercado não ocorre no Jornalismo praticado no Brasil - mas ao menos durante o curso, numa Faculdade, é isto que deve ser buscado.

Continua.
Leia a resolução na íntegra no Observatório da Imprensa.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Internacional - A situação da mídia na Argentina

Do Estadão:

"Deputados argentinos votam lei de controle da mídia nesta 4ª
Proposta de Cristina implica em restrições aos grupos de mídia e aumenta interferência do governo na imprensa

Ariel Palacios - O Estado de S. Paulo

BUENOS AIRES - Deputados votarão nesta quarta-feira, 16, a polêmica lei de radiodifusão, que implicará em grandes restrições aos atuais grupos de mídia na Argentina, além de aumentar a interferência do governo na liberdade de imprensa".

Do Conversa Afiada:

"Kirchner x Clarín: Argentina resolveu enfrentar o PiG(*) [...] Para Dênis de Moraes, que é autor do livro “A Batalha da Mídia – Governos Progressistas e Políticas de Comunicação na América Latina”, essa legislação coloca em confronto o grupo Clarín, mais poderoso conglomerado de mídia da Argentina, e o governo federal. “O objetivo do Clárin é desestabilizar os Kirchner e fazer com que volte ao poder um grupo de centro-direita”, diz".

Questão muito interessante, e recheada de discussões.

A primeira delas, para mim, é a forma parcial, inescrupulosa e desprovida de qualquer ética jornalística que o Estado de São Paulo tratou a informação. Taxando o governo argentino de ditatorial, interventor demais, e que tenta "ampliar seu poder e tentar emplacar uma nova candidatura Kirchner em 2011". Um grupo de mídia não pode - ou melhor, não DEVE - se omitir totalmente dos padrões jornalísticos da ética. Entretanto, isso parece possuir cada vez menos sentido no país, em convergência ao atendimento dos interesses mercadológicos das grandes empresas.

Segundo, o projeto ousado do governo argentino. Sim, antes de qualquer coisa, ousado. Entre as medidas, o panorama geral da imprensa argentina seria transformado: as licenças seriam equilibradamente distribuídas entre empresas privadas, públicas, e não governamentais sem fins lucrativos; há estabelecimento de limites geográficos para cada empresa; além de outras regulamentações no setor de radiodifusão.


Arte: AE. Fonte.

É complicadíssimo afirmar o que realmente motiva o governo do país vizinho: os interesses comerciais supostamente existentes entre a Casa Rosada e o setor de telefonia, que sai forte do projeto, ou o real interesse em desarmar um monopólio de comunicação muito parecido com o brasileiro - três ou quatro famílias controlando todas as maiores emissoras de informação, em todos os veículos.

Uma medida parecida no Brasil não parece sequer próxima: o governo Lula, que possivelmente teria apoio para medidas desta espécie nem chegou a tocar no assunto (salvo a ConfeCom que se dará no ano próximo - mas não podemos nem supor seus resultados).

Esperamos o desenlace.

Leia mais no próprio Estadão, e no Observatório da Imprensa.

domingo, 13 de setembro de 2009

Universidade - 7ª Feira de Cursos e Profissões da UFPR

Foi realizada nesse fim de semana (entre os dias 11 e 13 de setembro) a 7ª Feira de Cursos e Profissões da Universidade Federal do Paraná. Organizada pela Assessoria de Comunicação Social da UFPR, com a colaboração da Agência Experimental de Relações Públicas, a Prattica, a feira contou com estandes de todos os cursos da Universidade, além de palestras e apresentações diversas.

Estive presente no estande de Comunicação Social falando com os vestibulandos sobre a habilitação em Jornalismo. Além da experiência muito interessante, pude observar alguns pontos.



Panorama da Feira de Cursos e Profissões da UFPR deste ano. Fonte: http://www.flickr.com/photos/ufpr/3913534972/sizes/l/

Um grande número de pessoas, ao contrário do que eu esperava, veio conversar sobre a decisão (errônea) do STF em derrubar a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para exercício da profissão: muitos se mostraram interessados, outros apreensivos, e muitos mal informados. Minha resposta para as indagações acerca desta questão: o diploma de jornalismo não é mais exigido por lei, como era anteriormente. Porém, o curso de Comunicação com habilitação em Jornalismo ainda possui um valor considerável - não sendo, portanto, "perda de tempo" como algumas pessoas mais velhas insistem em afirmar. Porque, entre outras coisas, o conhecimento adquirido por meio de um curso como esse não é acessível a outras áreas. A fundamentação teórica e conceitual repassada, além da familiaridade adquirida com os aspectos técnicos da profissão, contribui favoravelmente ao estudante/formado em Jornalismo para ingressar no mercado de trabalho. E com certeza as empresas de comunicação levam isso em conta no momento da contratação - assim como levam em conta o diploma dos colegas publicitários, profissão que também não é regulamentada como deveria ser.

Por fim: o diploma de jornalismo não é mais exigido por lei, de fato, mas o curso de Comunicação/Jornalismo não perdeu o valor de curso superior respeitado.

Ainda, gostaria de parabenizar a organização da Feira, por todo o suporte dado aos estudantes da UFPR.

Para ler mais sobre o diploma, clique aqui e aqui.
Para ler sobre a 7ª Feira de Cursos e Profissões da UFPR, clique aqui e aqui.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Literatura - I Bienal do Livro de Curitiba

Foi realizada entre os dias 27 de agosto e 4 de setembro a I Bienal do Livro de Curitiba. Aparentemente bem organizada, a Bienal reuniu inúmeros nomes da literatura contemporânea nacional, como Cristovão Tezza, Antonio Torres, Carlos Heitor Cony, Moacir Scliar e outros.

Tive a oportunidade de participar de uma oficina de crônicas com o baiano Antonio Torres. Assim como o próprio Tezza, Torres se mostrou surpreendemente simpático.

Antonio Torres.

Na sua vida, desempenhou papel de jornalista no Última Hora de São Paulo, foi publicitário e nos últimos anos dedica-se exclusivamente à literatura.

Com palavras sábias, Torres, no pouco tempo que convivemos, tentou nos mostrar a positividade da relação entre música e literatura. Apaixonado pelo jazz (especialmente pelo Thelonious Monk Quartet), o baiano de origem humilde se mostrou um gigante cultural. Disse que o que mais o encantava no jazz era o piano - e que seu objetivo, alcançado por uma crítica norte americana, seria uma "prosa melódica".

O pouco tempo de convívio com Antonio Torres foi excelentemente proveitoso, inesquecível, e com certeza deixou aquele "gostinho de quero mais". Com a esperança de em breve encontrá-lo novamente, deixo aqui minha homenagem.




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A minha pequena participação na Bienal serviu, além dos motivos óbvios, para demonstrar que o ambiente cultural do país é rico - muito mais do que aparenta. Para isso se desenvolver de maneira mais eficiente, é de relevância que eventos como a I Bienal do Livro de Curitiba cresçam (ou não?) e consigam angariar maior participação popular.

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Leia mais sobre a I Bienal do Livro de Curitiba aqui e aqui.
Leia também sobre a FLIP deste ano aqui.
Para ler sobre Antonio Torres clique aqui. E para ler Antonio Torres clique aqui.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Literatura - Tezza, mais uma vez

Do caderno Ilustrada, da Folha:

"'O Filho Eterno' vence 6º Prêmio Passo Fundo
da Folha Online

O romance "O Filho Eterno", do escritor Cristovão Tezza, venceu o 6º Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura."

Mais um para a coleção de Cristovão Tezza e seu filho eterno.


A propósito, Tezza esteve na I Bienal do Livro de Curitiba, (que futuramente receberá um post exclusivo) ontem, participando de um café literário, e hoje, de uma mesa sobre romances.

Pude estar presente no café, e conviver mais alguns momentos (além daqueles prazerosos em sala de aula) com a figura marcante de Cristovão, que prefere ser chamado assim ao "professor", que certamente ele definiria como carregado de significados. De quebra, ainda tive meu "O Fantasma da Infância" autografado.

Não deixe de ler a coluna semanal de Cristovão Tezza na Gazeta do Povo.